domingo, setembro 25, 2022

Aparecida do Norte, 25 de setembro de 2022

 

Começo a escrever na van, retornando com o grupo para casa. Depois de 3 anos de início, finalmente concluí o Caminho da Fé, cheguei ao santuário de Nossa Senhora Aparecida.

O fim fácil que nunca chegava, os joelhos e panturrilhas em frangalhos, travadas até não poder mais, a primeira vista do Santuário depois de atravessar o rio Paraíba, o almoço antes de chegar na igreja, os quilômetros que se anda até pegar o certificado de conclusão do caminho, a missa das 14h com um sermão acolhedor que eu precisava ouvir e no final a benção dos objetos. Pedi para abençoar meu bastão de caminhada e meu cantil.

Também pedia para rezar por todos que pediram por nossa intercessão, e me lembrei de Aparecida, em 2019, lá no ramal de Mococa, que pediu para rezar por ela. Lembrei de todos que moram comigo, e dos meus sobrinhos. Todos foram abençoados com minha chegada em Aparecida.

Caminhar é muito bom e quem começa quer repetir a dose. Por isso tantas pessoas se prendem a um caminho, uma rota, tentando reviver os passos de forma melhor. Sim, o Caminho da Fé é encantador e árduo, mas já aprendi tudo o que queria com ele.

Minha próxima rota será Santiago de Compostela em 2025, um caminho português. Até lá o universo há de conspirar a favor de eu trilhar essa rota de uma vez só. Conhecer o mundo com 3 mudas de roupa e muito preparo físico. Manter corpo, mente e espírito sãos.

Minhas amigas entenderam na pele de onde vem a suposta loucura de caminhar dezenas de quilômetros todo dia carregando uma mochila. É um meio de superação. Vencer distâncias, vencer seus limites interiores. Um exercício de solidariedade e humanidade, para provar que você é mais um na multidão.

Obrigada Deus, Nossa Senhora, meu anjo da guarda, e todos que me acompanharam nesse caminho abençoado!

sábado, setembro 24, 2022

Guaratinguetá, 24 de setembro de 2022

O dia começou frio em Campos do Jordão. Casaco fleece e corta vento pra caminhar. A van nos levou até o horto florestal de Campos do Jordão, percorrendo os primeiros 15 Km e nos poupando da estrada sem acostamento.

A subida até o ponto mais alto do Caminho da Fé não é íngreme. Paisagens lindas, porém com subidas suaves para o Caminho da Fé.

As descidas são repletas de curvas e belas paisagens. Esperava terrenos mais íngremes, o que não livrou meus joelhos e panturrilhas de doerem no fim do dia. A distância entre uma pousada e outra foi de 57 Km. Cheguei no destino 17h20, nunca andei por tanto tempo. Usei o mato 2 vezes, nunca tinha feito isso no Caminho da Fé.

Andei no pelotão da frente, enquanto minhas amigas ficavam na retaguarda fotografando cada detalhe lindo que viam. Assim elas curtem o caminho. Eu apenas passo.

Esses peregrinos carregam a casa na mochila que despacham. Remédios mil, alicate de cutícula, lixa de unha, rolinho de massagem, hidratante labial e corporal, amostra de perfume...

Foi um dia bem cansativo porque foram muitos quilômetros de uma vez. Mas minhas unhas estão inteiras e minha cabeça não doeu até o ponto mais alto do Caminho.

Amanhã o trajeto será mais fácil, só preciso me recuperar. Faltam 20 quilômetros.

sexta-feira, setembro 23, 2022

Campos do Jordão, 23 de setembro de 2022

 

  Começo a escrever na rodovia, dentro da van. Tem música católica tocando.

No salão paroquial da igreja São Pedro ganhei colete de identificação para usar durante a caminhada, crachá para colocar na mochila que vai no carro de apoio, terço de lembrancinha, chaveiro da minha tia Silvia – ela quem fez.

A concentração começou na casa da Silvia, onde encontrei as duas Silvanas: uma tia minha, outra cunhada da Silvia. Nem me liguei para levar a camiseta da pescaria e andar uniformizada com o grupo, não gostei da camiseta com manguito porque já tenho minhas luvas com proteção solar. A blusa verde de pesca é a terceira preferida... Em viagens onde levo no máximo 3 blusas com proteção solar. Viagens que duram 2 dias ela fica de fora pra não carregar peso extra. Mas chegou pra ficar no meu guarda roupa peregrino, embora não esteja agora.

No grupo tem bastante gente experiente: vários estão fazendo o percurso com carro de apoio novamente. Eles andam de Crocs parte do percurso, me deu medo, preciso colocar minha parte na mochila de ataque amanhã.

Não sairemos caminhando da pousada. O trecho é perigoso e seremos levados até o horto. 15 km de tranquilidade e segurança.

Uma subida de deixar a cabeça zonza e uma longa descida de arrancar as unhas dos pés são meus fantasmas essa noite. Tudo possibilidade para amanhã. Fantasmas. Apenas suspeito dos desafios até Gomeral em Guaratinguetá amanhã. 

O certo é que tenho muita companhia boa me apoiando. Espero poder apoiar também.

quinta-feira, setembro 22, 2022

"Não sei se vou ou se fico

 Não sei se fico ou se vou...”


São Paulo, 22 de setembro de 2022


Essas duas semanas de intervalo do Caminho da Fé foram bem indecisas. 

Meu pai foi internado com pneumonia e acompanhei ele alguns dias. Minha mãe também estava muito ruim, com o pulmão congestionado e acompanhei-a no pronto socorro. Felizmente ela não precisou de internação. Meu pai teve alta hoje e tomará antibiótico na veia por dias seguidos em casa. Colheram sangue dele para acompanhar a evolução do tratamento, havendo alguma alteração chamam para o hospital novamente.

Meus pais medicados em casa, sinto-me confortável para viajar. Mesmo que somente meu pai estivesse internado, já estaria bom, eu não iria de jeito nenhum se meus dois pais estivessem no hospital. Mesmo depois de já ter pago toda viagem em grupo, depois de comprar pomada contra assadura e separar o dinheiro dos lanches. Cancelaria a viagem se meus pais estivessem internados. Meu coração não estaria na viagem, seria um desperdício.

Com meus pais bem, sendo cuidados em casa, posso curtir o fim de semana por completo. Obrigada Deus, Nossa Senhora e meu anjo da guarda! 


“Ficando eu sei que não fico

Ficando eu sei que não vou.”

Vinheta do programa do Silvio Santos 

domingo, setembro 11, 2022

Campos do Jordão, 11 de setembro de 2022

Começo a escrever hoje no ônibus, na rodoviária, voltando pra casa. Saí cerca de 6h20 e cheguei ao meu destino 13h45. Atravessei a Serra de Luminosa!

Ela é linda e muito cansativa. Parei pra descansar várias vezes. Na pousada do Mirante, no quilômetro 103, fui informada que deixei o pior pra trás. Foi um alívio.

Mais alguns morros e quilômetros depois chego ao asfalto. Encontro um carro de apoio a ciclistas de Ribeirão Preto que me ofereceu água, suco, bisnaguinha com goiabada. Faltavam 9 quilômetros para o meu destino. O motorista disse que havia mais uma subida em seguida várias descidas até Campista.

Antes disso havia parado na pousada da Dona Inês e enchido meu cantil, comido a maçã na serra de Luminosa, parei no restaurante Oásis e um peregrino sem mochila, que carregava apenas 2 garrafas, me pagou água, bananinha e paçoquinha, depois parei pra descansar no banquinho da pousada do Mirante e aproveitei pra reabastecer de água. O último ponto de apoio foi o carro dos ciclistas na estrada.

É muito bom caminhar na estrada. Terreno mais seguro para os pés, apesar de árido. A estrada tinha trechos em obras e precisei caminhar por pedriscos nós últimos quilômetros. Muito bem sombreada.

O almoço na pousada da Rose foi farto, comi com tranquilidade. Maurinho me levou de carro até a rodoviária de Campos do Jordão, peguei o último lugar no ônibus das 15h30.

O sentimento que fica após cumprir essa etapa do Caminho da Fé é gratidão. A Deus, Nossa Senhora, meu anjo da guarda e o universo.

 

sábado, setembro 10, 2022

Luminosa, 10 de setembro de 2022

Os 24 quilômetros de hoje tiveram muitos morros, mas foram bem espaçados. Nenhum excessivamente íngreme, porém muito extensos. Num deles parei por meia hora pra descansar.

Nunca parei tanto numa caminhada. Ponto de apoio 9h pra lanchar, depois a parada de meia hora 10h30, pousada do Jucemar 7 quilômetros antes do destino pra tomar água de coco, parada na divisa de Luminosa com São Bento do Sapucaí.

Encontrei muitos ciclistas no caminho, um me deu o gel de carboidratos na parada de meia hora. Caminhei com 2 casais: Regina e Genésio de Fortaleza, Ceará; Kelly e César de Macaé, Rio de Janeiro.

Acompanhava Regina e Genésio na última parada quando encontramos um pelotão de ciclistas com um carro de apoio que me levou 3 quilômetros adiante até minha pousada. O motorista do carro de apoio é Carlos Serafim, ele e seus amigos ciclistas são de Teresópolis, Rio de Janeiro; terminam o caminho amanhã. Está no caminho pela primeira vez e tem vontade de fazer de bike, não ir no carro de apoio da próxima vez. No total eles levam 4 dias de Águas da Prata até Aparecida.

Na pousada sou a única hóspede. Agora é descansar porque amanhã o dia será cheio. Chegando na pousada vou almoçar e voltar pra casa.

 

sexta-feira, setembro 09, 2022

Paraisópolis, 9 de setembro de 2022

A lua está linda hoje. Amarela e quase cheia, meu pequeno sol que me acompanhou durante a viagem.

Passei por Campos do Jordão antes de chegar em Paraisópolis.

Não sei pra que lado saio amanhã do hotel rumo ao Caminho da Fé.

Pois é, Paulo Coelho, você que no Diário de um Mago não foi até o final do Caminho de Santiago; parou num pórtico encurtando a viagem e fazendo valer a compostelana; aqui estou eu no Caminho da Fé abreviando meu trajeto. Ao invés de quase duzentos quilômetros que faltavam de Borda da Mata até Aparecida, percorro só os cem finais pra fazer valer meu passaporte Mariano.

Amanhã e depois farei quarenta e cinco quilômetros no total. Depois virá um fim de semana com um grupo onde percorrerei mais cinquenta e oito.

Vinte e quatro quilômetros amanhã! Serra de Luminosa! Deus, dai-me luz, bons joelhos e um bom descanso.

 

quinta-feira, setembro 08, 2022

"Tempo, tempo

 

mano velho

falta um tanto ainda, eu sei

pra você correr macio…”


São Paulo, 5 de setembro de 2022


Não acredito, fiz nova planilha, comprei passagem, arquei com os custos e próxima sexta embarco para Paraisópolis, Minas Gerais, tentando percorrer parte dos últimos cem quilômetros do Caminho da Fé. Os últimos cinquenta e oito, a partir de Campos do Jordão, farei com um grupo dia 24 e 25 de setembro.

Se não arrumar emprego antes, estou partindo. Tudo devidamente planilhado, reservado e pago.

Que Deus, Nossa Senhora e meu anjo da guarda me acompanhem. Deus no comando, Nossa Senhora me protegendo e meu anjo da guarda me guiando sempre. Que venha o melhor.


Tempo amigo

seja legal

conto contigo

pela madrugada

só me derrube no final.”

Sobre o tempo, Pato Fu

sábado, agosto 20, 2022

Borda da Mata, 20 de agosto de 2022

Chegou o último dia de peregrinação. Passei creme de arnica no joelho mas não teve jeito, pouco depois da metade do caminho ele doía demais. Sentei num banco e encontrei Mota, que disse que 500 metros adiante havia uma casa verde com banheiro e banquinho. O banheiro não tinha papel mas isso não era problema.

No banquinho desfiz minha mochila até encontrar minha faixa elástica para prende-la como joelheira. Andar tornou-se bem melhor, quase natural. Também comi meu lanche.

Depois parei no bar do Kiko pra tomar uma água de coco, e ele é o último ponto de apoio do trajeto. Apertada, entrei numa casa ampla faltando pouco para chegar na cidade. Descubro que é a pousada São Pedro, e entrará para o Caminho da Fé oficialmente mês que vem.

Chego no hotel em Borda da Mata com Newton, que também tem problema no joelho. A maioria dos hóspedes da pousada anterior hospedou-se nesse hotel.

Demorei pra tomar banho e não encontrei restaurantes abertos na cidade. Tomei um lanche caprichado na Padaria Real. Depois desci a pé até a pista para comprar um pijama. Como o Uber não funcionou, voltei a pé para o hotel.

No hotel foi uma luta danada pro recepcionista encontrar um Uber pra me levar pra rodoviária pra comprar passagem pra voltar pra casa. Chegando lá descubro que o ônibus de domingo sai 11h45 e a passagem é vendida pelo motorista.

Fortes emoções para o último dia. Mas consegui resolver tudo. 

Voltarei para o Caminho da Fé algum dia no futuro, partindo de Borda da Mata. Essas férias de uma semana foram maravilhosas, depois de 2anos sem pegar a estrada, recarreguei as baterias 

Agradeço a Deus, Nossa Senhora e meu anjo da guarda, que me acompanharam até aqui e hão de me acompanhar mais um dia em segurança até em casa; agradeço a companhia de todos que viajaram comigo, seja por alguns quilômetros, seja pelas palavras e fotos. Tem espaço pra todos no meu coração.

 

sexta-feira, agosto 19, 2022

Inconfidentes, 19 de agosto de 2022

Comecei o dia tirando foto de quase todos da pousada: os cavaleiros, os peregrinos que caminharam 37 quilômetros ontem, a dona da pousada e eu na selfie. Só faltou o seu Mota, que tomou café e saiu mais cedo.

O caminho até Ouro Fino foi tranquilo, tempo frio e nublado, lógico que na entrada da cidade tirei foto do menino da porteira. Depois pega a zona rural de Ouro Fino, e fica bem agradável o percurso também. 

Seria melhor ainda se eu não achasse hoje de manhã que meu joelho esquerdo está cem por cento e não precisa de creme de arnica. O percurso de 16 quilômetros de hoje nem é tão acidentado assim, mas chegando no quilômetro 240 uma picape parou me oferecendo água, paçoquinha e mel. Dessa vez aceitei, meu joelho estava começando a doer e apesar de já ter passado mais da metade do percurso, estava começando a ficar cansada. 

Nas paradas para fotos nos quilômetros finais, voltar a andar era um martírio, com meu joelho dando o ar da graça e teimando em continuar parado. Descer as escadas da pousada onde cheguei às 10h52 foi difícil.

Comi meu lanche preparado na pousada anterior, tomei café sem açúcar, tomei banho, lavei roupa, liguei pro meu pai, fui ao bar do Maurão. Lá comi um pastel de carne e tomei uma Fanta, mas o melhor foi descobrir que Borda da Mata é a capital do pijama. Estou precisando de pijama novo, não tinha lugar melhor para terminar minha caminhada. 

Pois é, as férias de uma semana estão quase acabando. Caminhei pensando nisso. Que presentão! Quanta gente conheci viajando assim! Quantos lugares de encher os olhos! Quanta superação física e espiritual!

Amanhã tem mais 21 quilômetros e também pode chover, o tempo estará frio. Amanhã não esqueço o creme de arnica no joelho.

 

quinta-feira, agosto 18, 2022

Crisolia, bairro de Ouro Fino, 18 de agosto de 2022

Estava crente que sairia sozinha da pousada às 5 da manhã, já que um grupo saiu às 4, mas não: saí com Jeferson, outro peregrino solitário, mais ou menos 6 horas, que foi quando amanheceu.

Ele me acompanhou o trajeto inteiro, e quando chegamos na minha pousada em Crisolia às 11h51 ele almoçou para depois seguir até Inconfidentes. Eu, invés de almoçar fui tomar banho e lavar roupa. Acabei almoçando junto com Mota, que chegou depois de mim.

No caminho passamos pela pousada onde o grupo que conheci no dia anterior ficou, e me atentei para o fato de que pouco depois da pousada havia um morro muito íngreme. O temido morro do sabão, onde não passam carros e tem 1079 metros de altitude. No pé do morro tem um bar – que estava fechado – e uma gruta com uma boca de água potável. Paramos lá por meia hora antes de encarar o morro. Um casal que havia saído de uma pousada mais próxima não parou e fomos alcança-los quilômetros adiante.

Tem muita plantação de café nessa parte do caminho. Paisagens belíssimas. Uma flecha no muro de uma igrejinha. Mas também uns 6 quilômetros de asfalto até entrar na cidade de novo.  

Hoje, com companhia, fui mais rápida. Mesmo parando para descansar várias vezes. Além do morro do sabão, paramos em outra pousada pra tomar coca. O dono, Zacarias, oferece queijo e café de cortesia aos peregrinos. Eu comi meu lanche de pão com queijo e dispensei o café por causa da arritmia. Faltavam 9 quilômetros para chegar na minha pousada. No meio do trecho da estrada de asfalto tem um banco de pedra, e novamente paramos um pouco pra descansar. Foi então que ele me contou que tem a mesma doença incurável que eu. Por outros motivos, com outros sintomas, toma outro remédio. E nossa irmandade não para por aí: ele é leonino do dia 3 de agosto, por isso é tão gentil e alegre.

Jeferson tem 47 anos, separado há 7 anos, mora em Salto de Piracicaba, próximo a Sorocaba, é funcionário da prefeitura e está fazendo o Caminho da Fé pela primeira vez. Ele não agendou nenhuma pousada, vai na cara e coragem. Hoje os dois bastões que ele usava quebraram.

Amanhã talvez eu pegue chuva entre os 16 quilômetros até Inconfidentes. Meu penúltimo dia de caminhada.

 

quarta-feira, agosto 17, 2022

Serra dos Limas, bairro de Andradas, 17 de agosto de 2022

Éramos 9 na pousada, eu e mais 2 saímos 6h25 da manhã. Os outros 6 eram um grupo e pegaram carona até a entrada da cidade de Andadas, isso dá 6 Km. Esse grupo pediu para traslado de mochila, eles hoje caminham 27 Km. Meus dois companheiros do início de caminhada, Rogério e Lourenço, também caminham 27, ficam na mesma pousada. Eu hoje caminho 21.

Descidas até entrar na cidade, passando em frente um hotel parei para tirar meu casaco corta vento e me distanciei dos colegas. Tem uma igreja que carimba a credencial, mas não quis entrar. Atravessei a cidade e já na zona rural encontramos uma capela de Nossa Senhora de Guadalupe com banheiro. Foi também um alívio ver a seta depois de tanto andar. Fica pouco antes do quilômetro 282, a metade do meu caminho. O grupo inteiro descansou um pouco nos bancos e soube que estava a frente de Rogério e Lourenço, que entraram na igreja na cidade. Deixamos o local eram 9h6.

Eu não estava com muita fome, mas tinha preparado um lanche para comer na metade do caminho. Procurei um lugar tranquilo para comer e encontrei uma árvore próxima a uma seta pouco antes do quilômetro 280. Após penar numa subida depois do quilômetro 278, encontrei Marcelo e Glaucia sentados ao pé de um morro que disseram ter 2 quilômetros. O morro é asfaltado e sinuoso, é a Serra dos Limas. Tomei a água do meu cantil, descansei 15 minutos e fui. Parei no quilômetro 276, no meio da Serra, com uma capela de Nossa Senhora de Lourdes e água potável. Ali tomei mais água, enchi meu cantil e esperei religiosamente trinta minutos. No fim da espera encontrei três ciclistas que também pararam lá e avisei que no alto da estrada tinha um bar. Consegui subir a serra com relativa facilidade, encontrei 4 colegas da pousada no bar e pedi uma Fanta. Eles já estavam de saída quando cheguei. Os ciclistas me alcançaram no bar e pararam um pouco lá também. O bar tem um mirante.

O Caminho da Fé testa a perseverança da gente. Pensamos horrores para atravessar distâncias e morros e somos compensados com paisagens deslumbrantes.

Quatro quilômetros adiante, com descidas e trechos retos, no pé de uma descida encontrei a pousada da Dona Natalina. Cheguei 13h15. 

Falei com meu pai, tomei banho, lavei roupa, almocei, agora é descansar para os próximos 20 quilômetros de amanhã.

 

terça-feira, agosto 16, 2022

Andradas, 16 de agosto de 2022

 

Hoje foi um bom dia para caminhar. O café foi servido 5h30, saí 6h. O caminho começa de cara com o pico do Gavião, que fica longe e é morro atrás de morro com algum descanso entre eles.

Já no primeiro quilômetro, quando paro para fotografar a primeira placa de quilometragem, meu coração gritou. Tudo porque ajustei mal a mochila, o peso estava nas costas até então, não nos quadris. Decidi que iria parar para lanchar a banana que peguei no café da manhã no quilômetro 304, quando daria metade do trajeto do dia.

Bandos de periquitos me acompanharam pela manhã. A paisagem é linda! Mares de morros com verdes bem diversificados. No quilômetro 306 encontrei o carro de apoio da turma que se hospedou comigo. O avanço ficava próximo a uma cachoeira, tirei foto depois de sentar no banco que o carro de apoio tinha trazido, comer uma goiabada, a minha banana, encher meu cantil. Isso era por volta das 9 horas da manhã.

O quilômetro 304 fica na beira da estrada, debaixo de muito sol. Ainda bem que parei junto da Dryka do carro de apoio. São 4 peregrinos de Capitólio que estão fazendo o Caminho da Fé com ela. No caminho também conheci um casal de Belo Horizonte, a Kátia de Sorocaba, com quem caminhei até a pousada e ela foi mais adiante, o Mota que estava na mesma pousada que eu, saiu 4 da manhã porém caminha mais devagar e vai ficar numa pousada mais longe. O Mota faz o caminho pela 12ª vez.

Pouco depois do quilômetro 302 tem uma capela com água potável, banco e banheiro. Uma alegria só parar uns minutinhos lá e ainda poder ir ao banheiro. Foi onde conheci o Mota e a Kátia.

Depois do quilômetro 296 começam as descidas íngremes. Precisa de tanto cuidado quanto uma subida e quem sofreu dessa vez foi meu joelho esquerdo.

Cheguei na pousada com a Kátia, e é também um restaurante. Ela tomou suco de abacaxi e me deu um copo. Eu já cheguei pedindo uma água gelada. Comi o pé de moleque que peguei no carro de apoio, liguei pro meu pai, fui tomar banho e lavar roupa.

Só depois fui almoçar. Hoje ainda tem jantar. Depois do almoço tomei café sem açúcar, esqueci minha abstinência. Ao menos não vou caminhar mais hoje. Amanhã o café da manhã será às 6 e andarei 21 Km até Serra dos Limas.

Na pousada conheci Marcelo e Glaucia, que fazem o caminho com mais um casal.

segunda-feira, agosto 15, 2022

Águas da Prata, 15 de agosto de 2022

 

As últimas coisas a irem pra mochila foram o kit bolha, o pente de cabelo e as garrafas d’água. Depois da rotina do café da manhã, listei as cidades das pousadas no meu aplicativo do tempo.

Me aguarda uma semana quente e seca, com chuva e frio só na sexta-feira. Coloquei no bolso meu frasco de soro fisiológico.

No metrô, a caminho da rodoviária, um artista tocou bossa nova no vagão. Na rodoviária comprei um lanche e só comi meio dia. Pro meu corpo acostumar a ficar um bom tempo sem comer, como serão os próximos dias. Sentir o que é necessidade. Não terei isso de comer a cada três horas.

Antes de sair deixei uma cópia do meu roteiro com meu pai. Quais são as pousadas, quais telefones e endereços, em que quilômetros do Caminho da Fé estão, em que dia chegarei nas pousadas, quantos quilômetros caminho em cada dia. Meu pai pode me vigiar em tempo integral durante o percurso: compartilho com ele minha localização pelo WhatsApp.

Tinha passageiro que não sabia que precisa usar máscara no ônibus. Dia ensolarado e quente. Viajei com meu casaco corta vento, que não esquenta muito, só barra o vento.

Nas minhas roupas dessa vez não levo nenhuma camiseta de natação. São três camisas de proteção solar 50 mas feitas para caminhantes ou pescadores, têm caimento solto, não aquecem o corpo.

Sem a água, minha mochila pesa 5,6 Kg. Com a água posso dizer que carrego cerca de 7,6 Kg; que são duas garrafas de 500 ml e um cantil de 750 ml.

Fui a última peregrina a chegar na pousada. Eram 15h30 mais ou menos. A dona ficou feliz em não precisar esperar até 22h para todos os peregrinos chegarem. Ela me viu toda paramentada e achou que já fiz o Caminho da Fé. Eu disse que sou experiente, em 2019 fui de Mococa até Águas da Prata, e agora continuo o caminho, que nunca percorri. Café da manhã será a partir das 5h30 amanhã. Adorei o horário.

Liguei pro meu pai avisando a chegada, tomei banho, liguei pra pousada seguinte avisando minha ida amanhã. O atendente disse que amanhã tem bastante gente na estrada, ele mesmo receberá vários grupos. Fiquei muito feliz em saber que não estarei só no trajeto, isso dá mais segurança.

Não encontrei restaurante, padaria ou boteco por perto. Passei numa vendinha e meu jantar foi uma vitaminada bolacha de chocolate recheada, um pacote de 50 gramas de batata também vitaminada, e 300 ml de água de coco em caixinha. Comprei amendoim salgado pra levar de emergência. Espero que o café da manhã seja bom. Amanhã começo minha abstinência de cafeína por amor ao meu coração. Dura a peregrinação inteira.

domingo, agosto 14, 2022

Que a fé não costuma faiá

 

(Gilberto Gil)


Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá


Que a fé 'tá na mulher

A fé 'tá na cobra coral

Oh oh

Num pedaço de pão


A fé 'tá na maré

Na lâmina de um punhal

Oh oh

Na luz, na escuridão


Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

olêlê

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Olálá


Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Oh menina

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá


A fé 'tá na manhã

A fé 'tá no anoitecer

Oh oh

No calor do verão


A fé 'tá viva e sã

A fé também 'tá prá morrer

Oh oh

Triste na solidão


Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Oh menina

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Olálá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Certo ou errado até

A fé vai onde quer que eu vá

Oh oh

A pé ou de avião

Mesmo a quem não tem fé

A fé costuma acompanhar

Oh oh

Pelo sim, pelo não

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Olêlê

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Olálá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá (olêlê, vamos lá)

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá (costuma, costuma a fé não costuma faiá)

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá (costuma, costuma a fé não costuma faiá)

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá

Andá com fé eu vou

Que a fé não costuma faiá (olêlala)

Andá com fé eu vou que a fé não costuma faiá

sábado, agosto 13, 2022

“Deixa eu querer voar

 enfrentar meus problemas

eu mirei na lua

e acabei acertando as estrelas..”


São Paulo, 12 de agosto de 2022



Está tudo pronto, reservei as pousadas para passar uma semana no Caminho da Fé. Saio de Águas da Prata na terça e chego em Borda da Mata no sábado. Quase não acredito.

Continuei usando coletor menstrual e absorvente de pano, me adaptei bem, comprei até um copo retrátil onde ferver o coletor para levar nas viagens – faz menos volume do que a caneca de plástico.

Em 2021 perdi o emprego, em 2022 encontrei um emprego temporário para cobrir licença maternidade e férias, agora é minha vez de tirar férias. Microférias, enquanto aguardo resultado de entrevistas e processos seletivos. Apenas uma semana sem procurar nada novo, apenas caminhando e espairecendo as ideias.

Meu presente de aniversário, de pandemia, de tempos árduos. A árdua tarefa de acordar e caminhar quilômetros com uma mochila nas costas.

Vamos eu, Deus, meu anjo da guarda, Nossa Senhora, e quem mais encontrar pelo caminho. Uma aventura sem igual.


Bobo sou eu,

que tão fácil caí na sua

De tantos que já me pediram

eu fiz a tal canção pra Lua”


A tal canção pra lua, Vitor Kley

sexta-feira, agosto 12, 2022

“Se as meninas do Leblon não olham mais pra mim

eu uso óculos…”


São Paulo, 15 de fevereiro de 2022


Surgiu mais um item essencial para a caminhada e a vida no geral: óculos de grau. Eu que já caminharia com óculos escuros numa boa… pois é, agora eles possuem grau porque tenho dificuldade em enxergar de longe.

Dificuldade em ler coisas distantes. As letras embaçam. Isso dificulta pegar ônibus onde não estou acostumada, ler com mais rapidez as placas nas estradas, ler avisos nas salas onde presto prova para concursos.

Com isso ganho mais um médico para consultar anualmente: o oftalmologista.

Vamos completar dois anos de pandemia de COVID, completarei dois anos de encontros virtuais com os amigos espíritas. Nesses encontros costumo ligar uma luz contra meu rosto do meu lado direito para me verem melhor por alguns minutos. Essa prática só piorou o problema que a idade poderia me trazer naturalmente. Ao perceber meu erro, passei a direcionar a luz da escrivaninha para a parede durante as chamadas de vídeo.

Minhas primeiras lentes têm 0,5 grau no olho esquerdo e 1,0 grau no olho direito. Meu óculos com armação azul veio com lentes em formato gatinho resistentes a queda, fotossensíveis – dessas que escurecem no sol. Me deixam com uma cara de pessoa calma.

Cheguei em casa e tive vontade de não tirar os óculos. Tudo que ficasse a mais de um metro estava mais nítido, as janelas da cozinha melhoraram como nunca! Depois do entusiasmo, guardei para usar somente ao sair de casa.

Haviam modelos alegres, discretos, escolhi um que transmite o que mais costumo passar para as pessoas: calma, tranquilidade. Assim combina com minha personalidade.

Eles podem ser lavados com detergente neutro e enxugados com papel higiênico macio. As lentes não devem ser esfregadas nas roupas, por isso veio a flanelinha própria.

Além de armação bonitinha as lentes precisam de uma boa qualidade porque serão usadas majoritariamente ao ar livre, onde as intempéries são muitas. Meu primeiro óculos de grau é top.


Se eu te disser periga você não acreditar em mim

eu não nasci de óculos

eu não era assim, não!”

Óculos;Herbert Vianna 

quinta-feira, agosto 11, 2022

“Campeão, vencedor

Deus dá asas, faz teu voo..”


São Paulo, 02 de agosto de 2021


Ontem foi um domingo de conquistas impossíveis. De madrugada, Rebeca Andrade voou no salto sobre o cavalo e conquistou a primeira medalha olímpica de ouro nesse aparelho de ginástica. Minutos mais tarde encontrei Luzia e Silvana na estação Prefeito Saladino para fazer trilha em Paranapiacaba.

No ônibus em Rio Grande da Serra encontramos quatro jovens na casa dos vinte anos que tinham combinado fazer trilha com Vanderlei. Achamos boa ideia engrossar o grupo deles. No fim quem nos guiou foi Eva e fizemos amizade com Marcelo, que foi só e mora em Itaquera, onde tem uma sorveteria.

Marcelo é casado, leonino, tem uma filha, pegou gosto em caminhar ao precisar sair com a cachorra. No verão a sorveteria fica bem movimentada e ele não faz trilha.

Fizemos uma trilha com três pontos de parada: o mirante, o sistema de esgoto, o olho d’água. O mirante é lindo e foi a primeira trilha que quis fazer quando cheguei em Paranapiacaba pela primeira vez, acompanhada do meu pai num longínquo agosto, comemorando meu aniversário. Anos mais tarde estou lá no mirante no primeiro dia do mês de agosto, com pessoas super especiais, com um stick de caminhada carinhosamente presenteado pela minha amiga Carolina, com um parafuso borboleta nele de cortesia do meu pai – que também madrugou para me levar até o metrô para a trilha.

Testei andar pelas montanhas de Paranapiacaba e pela trilha que mais queria caminhar usando o stick. Euforia? Mais tristeza e preocupação de que tudo ocorra bem e ninguém se machuque, nada de mal nos ocorra. Só me dei conta do quão especial foram os momentos hoje.

Percebi que não apertei tão bem assim o parafuso borboleta, escorregou um pouquinho a parte dele no caminho. Ajudou um pouco o percurso, bem pouco. Conseguiria caminhar sem o aparelho, de tão fácil que era a trilha. Somente caminharia mais devagar e com mais medo, porque ele é um apoio dos bons, principalmente nas subidas.

Alegria tive com comida. Não lembro de ter comprado tanta para levar para casa depois de um passeio, estava generosa. Levei capuccino de canela, tempero de ervas finas, cebola agridoce caramelizada. Incentivar o comércio pode ser saboroso, principalmente se os comerciantes organizam feira com degustação.


Campeão, vencedor

Essa fé que te faz imbatível

Te mostra o teu valor”

Conquistando o impossível; Ebenezer Cesar De Souza, Solange Cesar De Souza

quarta-feira, agosto 10, 2022

“Depois de tanto caminhar

 

depois de quase desistir

os mesmos pés cansados voltam pra você...”


São Paulo, 11 de julho de 2021


Feriado de 9 de julho e minha amiga Carolina me convida a revisitar o trecho do Caminho do Sol entre as pousadas de Mombuca e Arapongas. Viajamos para Mombuca dia 9; caminhamos os 24 km entre as pousadas dia 10 - Joel, primo do Kalango, nos resgatou na chegada; voltamos de Mombuca hoje.

Minhas primeiras lembranças desse trecho do Caminho do Sol são até que boas. Me perdi com dois companheiros de caminhada pouco antes de chegar no trecho asfaltado, pegamos carona num carro de manutenção de cana até o ponto de desvio e depois continuamos o caminho sem grandes complicações. A nuvem do caminho(ponto de parada que os voluntários fizeram com lanche e música) foi memorável. Isso foi em 2018, estava no meu terceiro dia de caminhada (o detalhe é que em 2018 retomei a caminhada em Elias Fausto, para quem sai de Santana de Parnaíba – onde inicia o Caminho do Sol - é o oitavo dia de peregrinação), havia me preparado para a peregrinação frequentando academia.

Dessa vez me preparei para a quilometragem praticando yôga todo dia. Entrei no terceiro mês de uso de um aplicativo no celular.

Durante a caminhada meu corpo ficou relaxado, quase nada me incomodava, ficar parada demais para lanchar era um desses pontos. Porém o que pesou mesmo foram os morrinhos. Meu coração se esforçou legal neles. Yôga não dá resistência nenhuma, não é atividade aeróbica. A surpresa foi grande frente a morrinhos tão suaves do Caminho do Sol. A melhor preparação para fazer uma caminhada é com certeza caminhar com frequência. Correr um pouquinho ajuda, mas no geral o bom mesmo é fazer longas caminhadas como a que se pretende fazer por dias seguidos.

A prática regular de yôga foi boa porque hoje, dia seguinte ao esforço exaustivo, meu corpo dói muito pouco. O exercício prévio se mostrou um potente analgésico durante e pós caminhada, eliminando a maioria das dores que encontraria caso estivesse sedentária. Yôga é exercício sim e faz muita diferença!

O aprendizado foi o de me preparar para as próximas caminhadas com yôga todo dia sim, mas combinada com caminhadas e quem sabe um pouco de musculação. Trabalhar o corpo por completo, ganhando resistência no coração, pulmões e pernas para atravessar longas distâncias.

Kalango e Delma, hospitaleiros voluntários de Mombuca e Arapongas, pediram para limpar o albergue antes de nossa chegada. Carol e eu estávamos crentes de que precisaríamos limpá-lo no primeiro dia. Passamos uma vassoura na saída. Ou melhor, a Carol passou, porque o meu departamento no feriado foi a louça.

Carolina foi de uma generosidade ímpar comigo. E eu preocupando a moça com meu coraçãozinho no caminho, meu ritmo lento de caminhar, meus dedos apertados no tênis de caminhada que ela tentou me dar. Primeira vez em que caminhei de papete com meia.

Carol e eu ainda chegaremos em Santiago de Compostela juntas, pelo caminho português, com nossos pés cansados.


Meus pés cansados de lutar

Meus pés cansados de fugir

Os mesmos pés cansados voltam pra você

Pra você”

Pés Cansados, Sandy


terça-feira, agosto 09, 2022

“Jurei mentiras e sigo sozinho

 assumo os pecados...”


São Paulo, 27 de junho de 2021


A pandemia que começou ano passado continua com todos de máscara e começando a se vacinar pra valer, em julho chega a minha vez. Passamos dos 500 mil mortos por COVID em 19 de junho. Em março minhas férias de junho foram suspensas e até hoje não tenho previsão de quando ou se ocorrerão antes do fim do contrato. Em maio entrei em trabalho remoto permanente.

No fim de abril comecei a praticar yôga todo dia com ajuda de um aplicativo gratuito. Essa tem sido minha única atividade física tem agitado minha vida amplamente, abriu horizontes, me colocou em movimento em áreas nas quais eu não me mexia por um bom tempo. Além de dar vontade de partir para outras atividades físicas, como a boa e velha caminhada. Por hora fico só na vontade.

O lado chato de ser mulher é sangrar. Sangrar todo mês por um período determinado. No meu caso nenhuma dor me acompanha de aviso, durante ou depois, desapegada da matéria, eu sangro por oito dias mensalmente. Imagina viajar por vinte e cinco dias no mês. Fatalmente sangrarei na viagem.

Desde 2019, quando voltei do ramal de Mococa do Caminho da Fé, penso em alternativas para substituir os absorventes descartáveis. Naquele ano adotei absorventes de pano.

Com superfície interna de microfibra e a exterior de tecido impermeável, só precisa lavar depois do uso. Tem várias camadas internas e são presos por botões. O segredo é deixar de molho enquanto se toma banho para depois lavar com sabão. Uso um conjunto de seis unidades em dois tamanhos. Consigo trocar o lado do absorvente para aproveitar melhor o produto, inverter o lado que está na frente com o que está atrás.

É libertador não pensar em absorvente ao fazer compras. O sangue menstrual é sujeira que você precisa aceitar e aprender a limpar. Fez parte de você, agora vai pro ralo.

Até que me adaptei bem, estava tudo planejado para a mala: saquinhos para deixar os absorventes sujos e de molho, uma sacolinha para os limpos. Porém depois de tanto tempo usando reparei que demoram para secar, e essas coisas não são como meias, que podemos pendurar na mochila enquanto caminhamos para secar.

A opção foi experimentar um coletor menstrual. O famigerado copinho que substitui absorvente interno. Fui logo para o kit que vinha com caneca para esterilizar no micro-ondas.

O site do fabricante falava para experimentar sem estar menstruada para saber como seu corpo se adapta. Foi o que fiz.

Lavei com água e sabão o coletor e a caneca. Esterilizei o coletor cobrindo ele com água e colocando para ferver no micro-ondas por três minutos. Tirei do micro-ondas, lavei minhas mãos antes de tocar no coletor e esperei esfriar fora da caneca. Dobrei e coloquei o coletor em mim conforme as instruções. Processo tão desconfortável quanto colocar um absorvente interno pela primeira vez. Fiquei alguns minutos com o produto, somente o palito puxador incomodava um pouco, de resto, parecia que não tinha nada. Tirar o coletor foi incrivelmente fácil, ele saiu no formato de copinho.

Depois desse teste lavei com sabão, fervi novamente, deixei secar, guardei para usar nos dias de sangramento.

O coletor menstrual precisa ser esterilizado no início do ciclo e após o término. Nas demais trocas basta lavá-lo com sabão neutro. Minha intenção é usá-lo junto com os absorventes de pano, deixar o coletor para os dias de fluxo mais intenso.

O primeiro ciclo menstrual usando o coletor foi emocionante. Como estava em casa, mal sangrei já coloquei o absorvente de pano e preparei meu coletor. Coloquei o coletor no almoço e esvaziei antes de dormir.

A primeira troca foi desesperadora. O copinho não saía, por mais que puxasse. Se essa coisa fica em mim? Pensei em ir para o pronto socorro. Até que finalmente me acalmei e meus músculos relaxaram. Doeu um pouco, mas consegui. O segredo é esse: calma e relaxamento. Passei a noite com absorvente de pano e coletor, por precaução. Vem mais sangue nos primeiros cinco dias.

No dia seguinte acordo e esvazio o copinho em 20 minutos. Com preguiça e esperando o celular carregar, aguardo um tempo antes de fazer yôga. Tiro o coletor novamente no banho matutino depois do exercício. Dessa vez mais relaxada e já atenta ao movimento interno que preciso fazer para pegar o coletor. A retirada doeu menos. A dor e a dificuldade de tirar o produto deve-se ao vácuo formado entre o coletor e meu corpo.

Pensei que poderia ficar sem o absorvente de pano durante o dia, me enganei. O coletor vasa. Depois que coloco, depois que mexo haste por curiosidade, quando vou ao banheiro fazer xixi ainda limpo um pouquinho de sangue - mesmo que não procure a haste do coletor. Talvez com o tempo de uso encontre a posição certa de encaixe deixe de vazar.

Foi muito mais fácil lavar o absorvente de pano do que se eu estivesse usando apenas ele. O absorvente não usou metade da capacidade que possui.

O ponto positivo de toda essa experiência é que me sinto seca, mesmo sangrando. O coletor não incomoda meu corpo em nenhuma atividade, em nenhuma posição.

Deixei de usar o produto na manhã do quinto dia, quando coletei pouco sangue. Durante todo o período de uso ele vazou um pouco, porém nada justificava utilizar mais de um absorvente de pano por dia, na manhã do quinto dia as manchas no pano eram tão poucas que sequer troquei o absorvente.

Apesar da dor que o vácuo causa para tirar o produto, as trocas são poucas, ele fica confortável no corpo, segura muito bem a parte mais crítica da menstruação sem fazer muita sujeira, dá agradável a sensação de secura, como se tudo estivesse normal. A pequena dificuldade em tirar e o trabalho de esterilizar compensam, foi de fato uma escolha acertada.

O coletor menstrual e os absorventes de pano, bem como todos os apetrechos que os acompanham, vão para a minha mochila no Caminho da Fé com carinho.


Meu sangue latino

minha alma cativa.”

Sangue latino, Secos & Molhados

segunda-feira, agosto 08, 2022

“Você chegou, quase me matou

Foi daquele jeito, todo baile parou

Quase me levou, me levou todo meu ar, ar…”


São Paulo, 17 de novembro de 2020


No último sábado resolvi experimentar uma pizzaria famosa pelo Ifood. Meu irmão gosta dessa rede. Domingo de manhã eu e meu irmão comemos os últimos pedaços das pizzas. Nós e nossa mãe passamos mal o domingo inteiro.

Na base do chá de boldo, água com limão, muita água, paracetamol, até chá de atroverã tomamos. Diarreia, consegui jantar somente depois da meia noite para vomitar de madrugada. Segunda-feira de manhã foi difícil ficar em pé sem beber água. Segunda-feira era difícil me movimentar sem doer o corpo inteiro.

O que “chegou, quase me matou / Foi daquele jeito, todo baile parou /Quase me levou, me levou todo meu ar” tem nome: intoxicação alimentar.

A gente tem primeira vez pra tudo, não? Felizmente não peregrinava ao passar por isso.

Ontem, segunda-feira, fui ao pronto socorro, e além de soro com remédios recebi receita que não fica retida na farmácia. Entre os remédios estava Buscopan. Hoje conversei com minha amiga Silvana, e ela disse que ele faz parte da farmácia básica de viagem dela. Afinal, a gente nunca sabe quando uma mistura pode cair mal no estômago.

Essa carta serve para dizer que acumulei mais um item na mochila: o remédio contra dores abdominais, mal estar intestinal.

Caminhar nessas horas ajuda muito, o remédio é para não passar mal nem enquanto descanso.


Foi fulminante, (sou provocante)

Rolou um blecaute (esse é o meu forte)

Tô pra te falar”

Blecaute; Jota Quest

domingo, agosto 07, 2022

“Bebida é água

 

Comida é pasto

Você tem sede de quê?

Você tem fome de quê?”


São paulo, 5 de outubro de 2020


Ontem, um domingo nublado na primavera fervente de 2020, caminhei até uma cantina italiana no Jardins com Guilherme. Nos encontramos 10 horas no metrô São Judas, fiz um tour com ele pelo Santuário de São Judas, o santo das causas impossíveis, atravessamos a Avenida Jabaquara, Avenida Domingos de Morais, Avenida Paulista, até chegar na rua Haddock Lobo e descer pouco mais de um quarteirão no lado do bairro Jardins até a Cantina do Piero il Vero. O trajeto deu pouco menos de 10 quilômetros. Com medo sobre a segurança, pedi carona para meu pai até o ponto de encontro, não quis ir a pé.

Foi dia de testar usar a bandana como balaclava, protegendo cabelo e rosto nesses tempos de coronavírus, onde todos são obrigados a andar mascarados. Não usei chapéu. A bandada tem fator de proteção solar 50, como toda roupa que uso quando peregrino. Também usei óculos de sol e creme protetor solar fator 30 no rosto e pescoço. Como balaclava. Guilherme ganhou uma vermelha e preta, tecido frio. Ótima para dias quentes. Queria que deixasse meu amigo ficar com marca de máscara?

Durante o trajeto, Guilherme preferiu usar a bandana mais como máscara do que como balaclava. Porque esquenta mais do que uma máscara, isso é fato, mesmo com tecido frio. Minha bandana é de algo similar a algodão, porém mais fino e com proteção solar. Senti a boca muito seca com o pano na cara. Não senti um calor insuportável na cabeça, estava morna, mais fresca que um chapéu. O tempo estava muito fresquinho, 23°, ajudou bastante no conforto do teste.

Conclusão: minha bandana serve para as peregrinações, principalmente em temperaturas amenas. Em temperatura amena tudo é uma maravilha, tudo funciona na caminhada. Levando em conta o uso de ontem, imagino que ela também me ofereça conforto no sol escaldante. Frio ela não me deixa passar nesse país tropical.

As pessoas nos estranharam. Eu parecia uma muçulmana, ele um bandido. Andar acompanhada de um homem usando balaclava dá segurança. Estamos em campanha eleitoral, somente ele recebeu panfletos ao longo do caminho. Ao que parece, muçulmanas não recebem panfletos. Na maioria do caminho ele estava com a cabeça descoberta, enquanto eu só tirei o pano da cabeça no restaurante.

No sábado, véspera da caminhada, foi dia de cuidar do rosto. Fiz esfoliação com borra de café, iogurte e limão; depois apliquei máscara de limpeza de pepino da Avon. Uma semana sem máscara facial e meu rosto começa dar espinha. Na véspera das peregrinações também separo o dia para tratamento completo de pele, ao menos facial. Dez dias antes da partida tem sessão de manicure e a imprescindível pedicure. Para começar a viagem na melhor forma. No caso foi apenas um exercício mais puxado.

Que saudade de caminhar! Desde março, última vez em que fui ao Parque da Cantareira, não encarava tanto chão. Dessa vez a maior parte da caminhada foi em terreno plano, definitivamente não é teste para o Caminho da Fé. Uma boa retomada de exercícios físicos.

Além das igrejas do Santuário de São Judas Tadeu, nós visitamos a igreja de Nossa Senhora da Saúde, na estação Santa Cruz; descobri que a saída da estação Santa Cruz com o colégio Arquidiocesano é ponto histórico de rap; pesquisamos artigos muito úteis na Decathlon da Avenida Paulista.

Meu irmão mais novo já trabalhou na região da Avenida Paulista e conhece bons restaurantes por lá. Acho uma boa ideia pesquisar se esses restaurantes abrem aos domingos e juntar os amigos para caminhar e almoçar. Ao menos no mês que vem quero repetir o trajeto que fiz ontem com Carolina, que não foi porque se recupera de uma cirurgia. Quanto mais gente melhor.

O pão da entrada estava muito gostoso, a manteiga veio em bolinhas e parecia queijo visualmente, tinha um sabor incrível, manteiga de verdade. Berinjela muito bem temperada e apimentada na medida, azeitonas pretas ótimas no tempero, o molho de sardela Guilherme disse estar ótimo. No momento, não como nenhum tipo de carne aos domingos. Pedi um Carpaccio, o que será? Carne crua fatiada bem fina, com limão, mostarda, couve e muito parmesão. Comi a parte que não era carne. Próxima vez peço uma Caponatta. As massas da cantina servem duas pessoas e muitíssimo bem servidas. Como adoro provar o que é novo pedi um Agnolotti, que são cappellettis grandes de massa verde recheados com ricota, nozes e uva passa. Foi o último do restaurante naquele dia. Molho ao sugo. Guilherme também ama uma ricota nas massas. E queijo! Não era molho com queijo ralado que tinha no prato dele, era queijo ralado com molho. Sem problemas! Quem come é quem manda no prato! Depois da massa não precisava de sobremesa alguma, mas a gente não pode deixar uma cantina italiana sem provar o clássico Tiramissu. Sabe-se lá quando volto num lugar desses, preciso aproveitar. Gente de Deus, que doce equilibrado! Creme suave, um toque amargo de café.

Depois desse almoço compreendi porque o movimento “Slow Food”, para comer de vagar e consciente sobre todos os ingredientes, começou na Itália. Eles têm muito material para isso!

Não faço ideia de quando poderei peregrinar de Águas da Prata até Aparecida. Não sei se até lá, como agora, continuaremos a usar máscaras no dia a dia. Os caminhos reabriram recentemente, o Caminho do Sol com grupos restritos a cinco pessoas, os demais não sei sobre os procedimentos de segurança.

Não sei os pormenores do futuro. Sei apenas que chegarei a pé em Aparecida do Norte, depois em Santiago de Compostela. Estou no rumo!


Desejo, necessidade, vontade

Necessidade, desejo (é)

Necessidade, vontade (é)

Necessidade”

Comida; Arnaldo Antunes, Sergio De Britto, Marcelo Fromer

sábado, agosto 06, 2022

“O pulso ainda pulsa

 

Peste bubônica, câncer, pneumonia

Raiva, rubéola, tuberculose, anemia

Rancor, cisticercose, caxumba, difteria

Encefalite, faringite, gripe, leucemia

O pulso ainda pulsa...”


São Paulo, 20 de março de 2020


Reservei as pousadas dias antes de ser decretada a pandemia mundial da gripe COVID-19. Essa gripe desfibrila os pulmões, também prejudica o coração. Quem tem problemas respiratórios e cardíacos sofre ainda mais, quem tem baixa imunidade nem se fala. Por essas e outras ela tem matado muitos idosos pelo mundo inteiro.

Agora o mundo inteiro está em quarentena, com as pessoas em casa, saindo só pra comprar comida, remédio, ou ir ao médico.

Hoje as lojas do centro de São Paulo fecharam. Os shoppings ficarão fechados do dia 23 de março ao dia 5 de abril. Espero que a parte mais crítica dessa pandemia passe suavemente no Brasil. Farei minha parte ficando em casa cuidando dos meus pais.

Desde terça-feira eu e meus pais começamos a tomar vitamina C, faremos isso por 1 mês. Para meu pai não ir comprar pão, passei a fazer tapioca para ele e minha mãe no café da manhã.

Hoje foi dia de cancelar todas as reservas do Caminho da Fé e descobrir que isolamento de cidade brasileira não é privilégio do Rio de Janeiro e a região do ABC metropolitano de São Paulo; Campos do Jordão também se isolou essa semana e o cancelamento de minha estadia na pousada era questão de dias.

A pousada de Borda da Mata me repassou o comunicado da Associação de Amigos do Caminho da Fé orientando peregrinos e donos de pousadas a remarcarem as viagens para o segundo semestre de 2020.

Não tenho previsão de quando entrarei em férias novamente, não posso remarcar pousadas sequer para o ano que vem. Essa pandemia mundial prejudica a economia de tal forma, que sair vivo e saudável em todos os sentidos após sua passagem já será um grande lucro.

Minhas férias não são problema, dois dias antes havia conversado com meus irmãos e meus pais sobre a viagem nessa época difícil, ontem tracei e abracei o plano B: fazer artesanato em casa, além de ler, ajudar mais na rotina e cuidar dos pais. Gostarei disso também, viverei de bom grado.

Hoje fui afastada do trabalho. Faço parte do grupo de risco porque moro com pessoas com mais de 60 anos.

Resta-me torcer e esperar confiante a situação mundial melhorar.


O pulso ainda pulsa

E o corpo ainda é pouco.”

O pulso; Marcelo Fromer, Antonio Bellotto, Arnaldo Antunes