pro
dia nascer feliz
Pro
dia nascer feliz
o
mundo inteiro acordar
e
a gente dormir, dormir
pro
dia nascer feliz...”
São
Paulo, 13 de março de 2017
Ontem
descobri quando exatamente o céu dá seu espetáculo de roxos,
laranjas, vermelhos e azuis: 5h43 da matina. São poucos minutos, as
cores aparecem até 5h45 – no minuto seguinte o céu já está com
seu azul claro normal do dia. Ontem fiz trilha em Paranapiacaba com
Guilherme e Silvana. Precisamente às 5h45 estava na plataforma da
estação São Caetano. A paisagem não era tão bela a ponto de
merecer uma foto, mas o céu estava lá, provando que o sol é a
estrela mais próxima desse planeta.
Se
no início da semana a previsão era de chuva para domingo, na
sexta-feira anterior a previsão era de tempo nublado. No dia fez um
sol maravilhoso. Perdemos somente a experiência de caminhar na
chuva, a mata atlântica de Paranapiacaba continua formosa.
O
tempo estava tão bom que deu vontade de fazer a trilha do mirante,
pena que não estava no programa dos guias. Silvana já conhecia o
guia Vanderlei, não precisamos ir na AMA (Associação de Monitores
Ambientais), esperamos em frente a igreja. Pela primeira vez vi o
pequeno cemitério da vila, encrustado na montanha. Estava
razoavelmente bem conservado. Era dia de evento gótico e Guilherme
foi o primeiro a avistar alguns no cemitério. Também foi a primeira
vez de Guilherme em Paranapiacaba.
Silvana
continua loira, porém num tom mais natural. Pra ter noção do
quanto sou desligada, se ela não fala sobre o tom do cabelo não
percebo a diferença. Ela e Guilherme conversaram bastante, além de
morar próximo Silvana leciona em São Caetano, por isso conhece bem
as cidades. Confessou que chegou a querer morar em Rio Grande da
Serra, e ainda planeja comprar uma bicicleta. O estranho foi comentar
horas antes com Guilherme que mulher dificilmente pratica esporte,
pois víamos vários homens ciclitas pegando o trem. Taí nossa
exceção quanto a esportes: a atlética Silvana, uma típica
sagitariana.
Fizemos
a trilha da cachoeira escondida. Uma cachoeira pequenina, num grotão
próximo a cidade. No caminho muitas bromélias, pétalas das flores
de manacá da serra, lírios do brejo nas encostas. Os lírios não
são nativos, os ingleses trouxeram para segurar barrancos e perfumar
defuntos em 1800. Hoje são pragas que não podem ser retiradas do
bioma que já se adaptou “mais ou menos” com as plantas. Caso o
bioma se adaptasse de fato os lírios não seriam pragas. No início
da caminhada atravessamos o primeiro campo de futebol brasileiro com
medidas oficiais, e descobrimos que Charles Miller era brasileiro
nato, porém descendente de ingleses. Estudou na inglaterra e trouxe
o futebol como lembrança.
Fui
com meu novo uniforme de peregrina: blusa e calça comprida, chapéu,
bota. Durante a trilha meti a bota na água por pouco tempo e
incrivelmente nem minha meia molhou. Minha bota super super fez seu
trabalho: provou-se impermeável. Estava preocupada por compra-la
focada mais em caminhadas longas do que trilhas, o solado de uma
específica para trilhas e montanhismo talvez seja diferente, mas ela
saiu-se bem em terreno muito acidentado. Não preciso de bota para
trilha, até porque mal faço trilhas, o que mais faço é caminhar
longas distâncias. Esse teste de trilha provou que a bota foi um bom
investimento, que custou metade do meu 13º na época porém
certamente me acompanhará até Santiago de Compostela. Se tudo der
certo até Santiago tem muito tempo e chão.
Hoje
pela manhã puxei a orelha de Silvana para comprar uma senhora bota
de caminhada, pois vale a pena. O tênis dela ficou molhado, e isso é
ruim para o pé, gera mais incômodos, dores, bolhas. Uma bota
decente deixa a gente menos preocupado e machucado. Pesquisei e
descobri que comprei realmente uma marca nacional top de linha. Meus
pés merecem e agradecem.
O
que uma bota de caminhada precisa ter: impermeabilidade, para não
deixar água entrar facilmente; sistema de ventilação, para manter
seu pé fresco quando você sua; levesa e conforto, porque ninguém
suporta longas distâncias com um tijolo nos pés. Guilherme
confessou que admirou minha bota, muito melhor que o coturno que ele
tem. Ele foi de tênis e não molhou o calçado atravessando os
riachos da trilha.
Recordando
direito, essa foi a segunda trilha que encarei com a bota. A primeira
foi no Camping Colinas de Cabreúva, quando atravessei com os quatro
peregrinos as colinas do camping e depois pegamos a estrada rumo a
Itu. Aquele terceiro dia de caminhada foi o mais emocionante: saímos
todos juntos na trilha, até chegar no alto da colina meu coração
disparou, depois peguei a estrada e vi a turma sumir adiante, cheguei
no Armazém do Limoeiro quando já estavam de saída, usei o humilde
banheiro da moradora vizinha, quase me perdi no caminho por três
vezes, na quarta vez não vi sinais, me desesperei e pedi por socorro
de todas as formas até o GoogleMaps dizer que estava a um quilômetro
e meio de distância do ponto de chegada. Chego no Haras do Mosteiro
três horas da tarde, depois de almoçar, tomar banho e lavar roupa
tiro minha única foto de animais no Caminho do Sol: galinhas da
angola. Me hospedo num haras e fotografo galinhas, as coadjuvantes
que moram no lugar somente para caçar cobras e preservar os cavalos.
Para compensar vi o amanhecer do dia seguinte enquanto tomava café.
Falando
em café, hoje o cardiologista me livrou do remédio para o coração
depois de ver meus exames. Continuo proibida de tomar cafeína mas as
drogas que uso diminuirão a partir de amanhã – tomei o remédio
em questão antes do café.
Que
emoções me aguardam no caminho que ainda não percorri? Como será
atravessar canaviais sem fim com o sol na cabeça? Será mais
emocionante do que o terceiro dia? Que pequenas belezas saltarão nos
meus olhos como os líquens vermelhos próximos ao lago de
Paranapiacaba, as bromélias nos altos das árvores, ou as pétalas
de flores rosadas no chão? Não, não espero flores no Caminho do
Sol, irei no tórrido verão. Com camisa de manga comprida e protetor
solar fator 70, para que o sol não me detenha.
“Nadando
contra a corrente
só
pra exercitar
todo
o músculo que sente
me
dê de presente o teu bis
pro
dia nascer feliz”
Pro
dia Nascer Feliz, Barão Vermelho