sexta-feira, julho 13, 2018

“Estamos meu bem por um triz

pro dia nascer feliz
Pro dia nascer feliz
o mundo inteiro acordar
e a gente dormir, dormir
pro dia nascer feliz...”

São Paulo, 13 de março de 2017

Ontem descobri quando exatamente o céu dá seu espetáculo de roxos, laranjas, vermelhos e azuis: 5h43 da matina. São poucos minutos, as cores aparecem até 5h45 – no minuto seguinte o céu já está com seu azul claro normal do dia. Ontem fiz trilha em Paranapiacaba com Guilherme e Silvana. Precisamente às 5h45 estava na plataforma da estação São Caetano. A paisagem não era tão bela a ponto de merecer uma foto, mas o céu estava lá, provando que o sol é a estrela mais próxima desse planeta.
Se no início da semana a previsão era de chuva para domingo, na sexta-feira anterior a previsão era de tempo nublado. No dia fez um sol maravilhoso. Perdemos somente a experiência de caminhar na chuva, a mata atlântica de Paranapiacaba continua formosa.
O tempo estava tão bom que deu vontade de fazer a trilha do mirante, pena que não estava no programa dos guias. Silvana já conhecia o guia Vanderlei, não precisamos ir na AMA (Associação de Monitores Ambientais), esperamos em frente a igreja. Pela primeira vez vi o pequeno cemitério da vila, encrustado na montanha. Estava razoavelmente bem conservado. Era dia de evento gótico e Guilherme foi o primeiro a avistar alguns no cemitério. Também foi a primeira vez de Guilherme em Paranapiacaba.
Silvana continua loira, porém num tom mais natural. Pra ter noção do quanto sou desligada, se ela não fala sobre o tom do cabelo não percebo a diferença. Ela e Guilherme conversaram bastante, além de morar próximo Silvana leciona em São Caetano, por isso conhece bem as cidades. Confessou que chegou a querer morar em Rio Grande da Serra, e ainda planeja comprar uma bicicleta. O estranho foi comentar horas antes com Guilherme que mulher dificilmente pratica esporte, pois víamos vários homens ciclitas pegando o trem. Taí nossa exceção quanto a esportes: a atlética Silvana, uma típica sagitariana.
Fizemos a trilha da cachoeira escondida. Uma cachoeira pequenina, num grotão próximo a cidade. No caminho muitas bromélias, pétalas das flores de manacá da serra, lírios do brejo nas encostas. Os lírios não são nativos, os ingleses trouxeram para segurar barrancos e perfumar defuntos em 1800. Hoje são pragas que não podem ser retiradas do bioma que já se adaptou “mais ou menos” com as plantas. Caso o bioma se adaptasse de fato os lírios não seriam pragas. No início da caminhada atravessamos o primeiro campo de futebol brasileiro com medidas oficiais, e descobrimos que Charles Miller era brasileiro nato, porém descendente de ingleses. Estudou na inglaterra e trouxe o futebol como lembrança.
Fui com meu novo uniforme de peregrina: blusa e calça comprida, chapéu, bota. Durante a trilha meti a bota na água por pouco tempo e incrivelmente nem minha meia molhou. Minha bota super super fez seu trabalho: provou-se impermeável. Estava preocupada por compra-la focada mais em caminhadas longas do que trilhas, o solado de uma específica para trilhas e montanhismo talvez seja diferente, mas ela saiu-se bem em terreno muito acidentado. Não preciso de bota para trilha, até porque mal faço trilhas, o que mais faço é caminhar longas distâncias. Esse teste de trilha provou que a bota foi um bom investimento, que custou metade do meu 13º na época porém certamente me acompanhará até Santiago de Compostela. Se tudo der certo até Santiago tem muito tempo e chão.
Hoje pela manhã puxei a orelha de Silvana para comprar uma senhora bota de caminhada, pois vale a pena. O tênis dela ficou molhado, e isso é ruim para o pé, gera mais incômodos, dores, bolhas. Uma bota decente deixa a gente menos preocupado e machucado. Pesquisei e descobri que comprei realmente uma marca nacional top de linha. Meus pés merecem e agradecem.
O que uma bota de caminhada precisa ter: impermeabilidade, para não deixar água entrar facilmente; sistema de ventilação, para manter seu pé fresco quando você sua; levesa e conforto, porque ninguém suporta longas distâncias com um tijolo nos pés. Guilherme confessou que admirou minha bota, muito melhor que o coturno que ele tem. Ele foi de tênis e não molhou o calçado atravessando os riachos da trilha.
Recordando direito, essa foi a segunda trilha que encarei com a bota. A primeira foi no Camping Colinas de Cabreúva, quando atravessei com os quatro peregrinos as colinas do camping e depois pegamos a estrada rumo a Itu. Aquele terceiro dia de caminhada foi o mais emocionante: saímos todos juntos na trilha, até chegar no alto da colina meu coração disparou, depois peguei a estrada e vi a turma sumir adiante, cheguei no Armazém do Limoeiro quando já estavam de saída, usei o humilde banheiro da moradora vizinha, quase me perdi no caminho por três vezes, na quarta vez não vi sinais, me desesperei e pedi por socorro de todas as formas até o GoogleMaps dizer que estava a um quilômetro e meio de distância do ponto de chegada. Chego no Haras do Mosteiro três horas da tarde, depois de almoçar, tomar banho e lavar roupa tiro minha única foto de animais no Caminho do Sol: galinhas da angola. Me hospedo num haras e fotografo galinhas, as coadjuvantes que moram no lugar somente para caçar cobras e preservar os cavalos. Para compensar vi o amanhecer do dia seguinte enquanto tomava café.
Falando em café, hoje o cardiologista me livrou do remédio para o coração depois de ver meus exames. Continuo proibida de tomar cafeína mas as drogas que uso diminuirão a partir de amanhã – tomei o remédio em questão antes do café.
Que emoções me aguardam no caminho que ainda não percorri? Como será atravessar canaviais sem fim com o sol na cabeça? Será mais emocionante do que o terceiro dia? Que pequenas belezas saltarão nos meus olhos como os líquens vermelhos próximos ao lago de Paranapiacaba, as bromélias nos altos das árvores, ou as pétalas de flores rosadas no chão? Não, não espero flores no Caminho do Sol, irei no tórrido verão. Com camisa de manga comprida e protetor solar fator 70, para que o sol não me detenha.

Nadando contra a corrente
só pra exercitar
todo o músculo que sente
me dê de presente o teu bis
pro dia nascer feliz”
Pro dia Nascer Feliz, Barão Vermelho

Um comentário:

Unknown disse...

Ale, voce e demais, me deliciei com suas palavras. Pronta para publicar?