sexta-feira, novembro 17, 2006

Abobrinha sentimental

Quero pedir desculpas a João. Faz dois anos. Não há como encontra-lo, em memória tenho seu primeiro nome, seu rosto e que jogava hóquei. Tinha nome composto, esqueci o segundo porque usava só o primeiro. Faz sete anos recusei um coração dourado de quem podia ser meu primeiro namorado.

Ele não merecia o mal que lhe fiz. Demorei cinco anos pra perceber a dimensão desse mal. Os amigos diziam que um dia sofreria igual, esse dia nunca chegou. Talvez nunca chegue, seria justo demais para um mundo tão vil. Desculpa não resolve nada. Apenas comprova a consciência de quem cometeu um erro.

Tinha 15 ou 16, e um instinto suicida imperceptível a terceiros. Suicidas não merecem ser felizes, simplesmente porque não acham que mereçam. Quando a felicidade fica a um palmo de distância, o suicida acredita cegamente que aquilo não pertence a ele, que tudo não passa de fumaça. Daí Constantine não beija a mocinha no final e todos vivem felizes para sempre no filme. Como impedir alguém de cortar os próprios pulsos? Esse dilema o Centro de Valorização da Vida tenta resolver há anos.

O que aconteceu há sete anos: João me deu um presente de aniversário com uma carta que não abri. Nem presente nem carta. Deixei no meio de uma praça. Se levasse para casa teria de me explicar, e eu não queria. Receber presente, me explicar em casa, e o principal: não queria o coração do João. Tentei deixar claro. Havia muita gente melhor que eu por aí, não era difícil encontrar. Aquele cara merecia alguém melhor.

Merecia uma garota doce e romântica, e de preferência que não fosse suicida. Que não vivesse se boicotando, se escondendo em personagens de teatro. Eu era cítrica. Desde aqueles tempos minha força emocional petrifica meu coração.

Nunca fui suicida de cortar os pulsos, mas cortava ligações. Foi bem no começo e de uma vez só, era tortura condensada e explosiva. Achei que fosse fácil ele esquecer, não durou muito tempo, na verdade nem começou. Se alguém me fizesse coisa igual, não sofreria.

Ele tinha um coração de ouro, e sem perceber gostou de uma suicida. O mal que fiz não era pra ele, mas pra mim. Ninguém segurou minhas mãos, e se gritassem para parar, eu não escutaria. Precisava contrariar, provar ao mundo e a mim mesma que era cítrica e forte e insensível. Coisa de adolescente. Nesse caminho judiei de um coração.

PORÉM Hoje em dia ando menos suicida que naquela época.

5 comentários:

Anônimo disse...

Até que enfim atualizou, já estava quase desistindo de verificar... haha, brincadeira.
Quanto ao texto, há um certo arrependimento com uma mistura de nostalgia. Não sei bem.
Na adolescência, costuma-se fazer bobeiras. Mas penso que se não foi, é porque não era pra ser.
De qualquer forma, sempre bom ler um texto seu.
Bjs, bom fim de semana...prolongado.

Anônimo disse...

confesso, estou confuso

Anônimo disse...

Lindo texto!

Anônimo disse...

Ah! Já fui um João :)

Anônimo disse...

Eu também sou um João... E um suicida... o.o