sábado, outubro 05, 2019

“Vamos acordar

Hoje tem um sol diferente no céu
Gargalhando no seu carrossel
Gritando nada é tão triste assim...”

São Paulo, 6 de maio de 2019

Ontem foi dia de cozinhar para as amigas. No domingo anterior dei duas opções para Silvana e Luzia, elas preferiram lasanha de berinjela em vez de macarrão com brócolis. O acompanhamento foi frango frito e cidra sem álcool, parecia comida de ano novo. Sábado à noite preparei bolo de café para servir no café da tarde. Luzia trouxe pão australiano (que é preto e com mel) e sequilhos com goiabada. Para completar o café servi patê de berinjela e café preto com opção de colocar açúcar ou adoçante. De café entendo muito bem porque preparo todo dia para mim e meus pais. Resumindo: pelos meus dotes culinários apresentados domingo posso casar duas vezes. Não cultivo a menor expectativa de casar, se encontrar um moço interessante a situação muda de figura, porém confesso que será um pouco difícil para quem busca se realizar de outras formas.
Carolina foi a primeira a chegar de carro, depois de participar de uma caminhada de 10 Km que ela promoveu com o Centro de Práticas Esportivas da USP. Silvana e Luzia fizeram turismo pelo Jabaquara porque vieram a pé da estação e saíram pelo terminal rodoviário errado, levaram uma hora para chegar.
Com Carolina conversamos sobre peregrinações, ela me convenceu a usar fralda de pano como toalha já no Caminho da Fé, em vez de esperar para testar o equipamento em Santiago. Eu estava tão feliz com o encontro, planejar o Caminho da Fé, saber mais sobre o percurso, saber mais sobre Santiago e outras rotas que Carolina fez! Ela foi convidada só pra dar pitaco na nossa viagem e preparar principalmente Luzia, que começa a peregrinar nessa viagem. Carol se dispôs a emprestar equipamentos pra Luzia, assim ela não precisa gastar tanto no início sem saber se vale a pena repetir a experiência em outras rotas.
Não é todo mundo que cisma de chegar em Santiago de Compostela, planeja duas peregrinações anteriores no Brasil, já vai para a terceira e sempre começa confiante de que conseguirá concluir qualquer percurso que vem pela frente. No Caminho da Prece a dúvida era como meu corpo se comportaria, nunca foi se conseguiria concluir a caminhada – até porque durava apenas três dias. Não tem jeito, não consigo duvidar da minha capacidade antes do início e custo dar o braço a torcer e desistir durante a viagem. Custo até admitir que fico perdida, sou uma vítima da minha distração.
No dia anterior ao almoço enviei foto de faixa elástica de compressão que substitui joelheira. Pode ser amarrada também no pé ou no cotovelo. Pesquisei preços, e vi que o melhor é o do quiosque do shopping Boulevard Tatuapé, onde almoço depois de pintar unhas no asilo. Carol contou que nunca usou joelheiras na viagem porque tem medo de que esquente demais. O par de faixas está na minha lista de itens da mochila, porém esse mês quero investir em absorvente ecológico para saber se me acostumo e se vale a pena usar na viagem.
Eu, Luzia e Silvana concordamos que durante a viagem o melhor é manter-se no campo de visão. Quem vai mais a frente deve de vez em quando olhar para trás e ver a amiga. Decidi andar com alarme no celular para lembrar de olhar para trás a cada 15 minutos. Sem contar as paradas em bifurcações e pontos em que tiver dúvida.
Estava indecisa sobre a penúltima pousada, que ficava 50 Km distante da anterior. Pensei que precisaríamos adicionar mais um dia na viagem, porém Luzia sugeriu escolher como penúltima pousada uma em Ribeirão Grande, bairro de Pindamonhangaba. No papel fica 24 Km de Aparecida, esse percurso conseguimos cumprir em um dia. Depois do encontro, conversando com a pousada Chácara Dois Leões, descobri que a distância dela até o final é de 32 Km. A atendente disse que esse percurso é menos acidentado.
Entre Piracuama e Ribeirão Grande, dois bairros de Pindamonhangaba, há duas opções de caminho: pelo bairro Mandu tem 28 Km no asfalto; pelo bairro das Oliveiras tem 22 Km de terra, incluindo a Trilha das Borboletas e seus 5 Km de nível difícil, muitos morros. A atendente se disse gordinha sedentária e contou que sobreviveu à Trilha das Borboletas, também elogiou a sinalização da trilha e sugeriu parar na Casa da Dona Eva para fazer um lanche e quem sabe até pedir guia ou que mulas carreguem nossas mochilas pela trilha até a Chácara Dois Leões.
Um ponto levantado durante o almoço é que bebida alcoólica anestesia o corpo. Carol contou que uma vez durante o Caminho de Santiago sentia tanta dor no corpo que depois que experimentou um Tinto de Verano as dores durante a caminhada pararam e todo dia ela bebia uma caneca de meio litro (ele é servido em canecas generosas mesmo) para caminhar. Tinto de Verano (ou tinto de verão pra quem fala português) é um drinque com vinho tinto, refrigerante e muito gelo. Carol comentou que enquanto o Caminho de Santiago tem muito vinho, o Caminho da Fé tem muita cerveja e cachaça local.
Refleti e decidi me manter abstêmia por motivos ideológicos e médicos. Estranho minha mania de respeitar mais os motivos médicos do que os ideológicos. Já sei bastante das influências negativas que drogas causam no espírito e corpo, sei da minha sensibilidade nesses campos. É melhor viver abstêmia, consciente de si mesma, consciente das dores. Buscar expandir a consciência em vez de deturpá-la.
O que preciso agora é não cabular a parte de musculação do treino nunca mais. Os morros do Caminho da Fé não perdoam. Um alerta da Carol foi o culto ao sofrimento que os romeiros fazem, que pagam promessa e acreditam que se não sofrer não vale a pena. Os donos de pousada e habitantes locais acham pouco se não caminhamos 35 Km todo dia, chegando em frangalhos para descansar.
Gente de Deus! Tá na Bíblia! Ninguém vê Cristo sofrendo ao caminhar de uma cidade a outra para pregar a Boa Nova! Ele sofria com a incompreensão humana, que cismava em não entender suas mensagens de amor. Deus não fica feliz com o martírio de seus filhos, se alegra quando aprendemos a conviver como irmãos amados.

É tudo novo de novo
Vamos nos jogar onde já caímos
Tudo novo de novo
Vamos mergulhar do alto onde subimos”
Tudo Novo de Novo, Moska

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